ATA DA TRIGÉSIMA OITAVA SESSÃO SOLENE DA TERCEIRA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA LEGISLATURA, EM 29.10.1991.

 


Aos vinte e nove dias do mês de outubro do ano de mil novecentos e noventa e um reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre, em sua Trigésima Oitava Sessão Solene da Terceira Sessão Legislativa Ordinária da Décima Legislatura, destinada a homenagear o Dia dos Comerciários, conforme Requerimento nº 23/91 (Processo nº 89/91), aprovado, do Vereador José Valdir. Às dezessete horas e doze minutos, constatada a existência de “quorum”, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos e convidou os Líderes de Bancada a conduzirem ao Plenário as autoridades e personalidades presentes. Compuseram a Mesa: Vereador Airto Ferronato, Vice-Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, presidindo os trabalhos; Senhora Esther Machado, Presidente do Sindicato dos Comerciários; Senhora Dalva Arano, Presidente Porto-Alegrense dos Comerciários Aposentados; Senhora Ivone Ponzecchi, representando a Federação dos Aposentados e Pensionistas do Estado do Rio Grande do Sul; Vereador Leão de Medeiros, 1º Secretário da Casa. Em continuidade, o Senhor Presidente manifestou-se sobre o evento e concedeu a palavra aos Vereadores que falariam em nome da Casa. O Vereador José Valdir, em nome das Bancadas do PT, PDT, PTB, PCB e PL, manifestou-se sobre as perdas salariais sofridas pelos trabalhadores nesses últimos anos, salientando que a classe comerciária é um exemplo de luta defensiva. Afirmou, ainda, existir uma crise generalizada na produção comprometendo o comércio dos produtos. O Vereador Leão de Medeiros, em nome da Bancada do PDS, discorreu acerca da solenidade, dizendo que o princípio de liberdade deve ser respeitado e congratulando-se com o Sindicato e a Federação dos Comerciários pelo transcurso da data hoje comemorada. Na ocasião, o Senhor Presidente registrou correspondências recebidas referentes ao evento da Secretária Municipal da Educação, do Secretário Municipal da Indústria e Comércio e do Diretor da Empresa Porto-Alegrense de Turismo, EPATUR. Após, o Senhor Presidente concedeu a palavra à Senhora Esther Machado, que agradeceu a homenagem prestada por este Legislativo, propugnando por soluções para os problemas enfrentados sem que ocorra a necessidade de trabalho aos domingos. A seguir, o Vereador Adroaldo Corrêa solicitou cópia do pronunciamento feito pela Presidente do Sindicato dos Comerciários e, ainda, que esse discurso fosse distribuído aos demais Vereadores da Casa. Após, o Senhor Presidente agradeceu a presença de todos e, nada mais havendo a tratar, declarou encerrados os trabalhos às dezoito horas, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pelo Vereador Airto Ferronato e secretariados pelo Vereador Leão de Medeiros. Do que eu, Leão de Medeiros, 1º Secretário, determinei fosse lavrada a presente Ata que, após lida e aprovada, será assinada pelo Senhor Presidente e por mim.

 

 


O SR. PRESIDENTE (Airto Ferronato): Estão abertos os trabalhos. Em nome da Câmara Municipal de Porto Alegre, nós queremos registrar a nossa saudação e o nosso abraço aos comerciários pela passagem do Dia dos Comerciários, dia 29 de outubro.

Fará uso da palavra, em nome das Bancadas do PT, do PDT, do PTB, do PCB e do PL, o Ver. José Valdir.

 

O SR. JOSÉ VALDIR: (Menciona os componentes da Mesa.) Companheiros Vereadores, companheiros e companheiras trabalhadores do comércio, hoje, os trabalhadores, de uma maneira geral, são levados a enfrentar uma luta - que, eu diria, sob todos os aspectos - defensiva, não apenas por salário, que sempre é uma corrida atrás do prejuízo, e nesse sentido é defensiva. Mas porque cada vez mais os trabalhadores são forçados a se mobilizarem para evitar perdas e conquistas há muito asseguradas, inclusive muitas vezes com a concorrência do Poder Judiciário, que a gente tem assistido como tem julgado os dissídios e as questões de ordem trabalhista. Essa luta defensiva, por exemplo, é o caso da estabilidade ao funcionalismo público, sempre sob ameaça; é o caso, por exemplo, de eleições de diretores, apenas para citar dois exemplos. Mas também a crise econômica nunca se abateu de forma tão violenta sobre os trabalhadores como hoje, e nós já estamos, infelizmente, nos habituando ao fato de que uma crise sempre estabelece novos recordes sobre a crise anterior, pois cada vez o desemprego é maior, o salário e as condições de trabalho são mais aviltados.

O trabalhador do comércio é um exemplo de luta defensiva. Submetido aos piores horários, às piores condições de trabalho, salários aviltados como poucas categorias, o setor representa hoje um dos mais altos índices de descumprimento da legislação trabalhista, em que pesem a vigilância e a combatividade do Sindicato, sempre atento. Também hoje os comerciários, como outras categorias, estão ameaçados pelo retrocesso, pela revogação de conquistas arduamente conquistadas, como a gente sabe que rola nesta Casa, tentativas de burlar a Lei aprovada no ano passado aqui, a Lei do “Domingo Não”. O que talvez é específico da categoria dos comerciários é que talvez seja a categoria que tenha o patrão mais exigente, mais pão-duro e mais bem falante dos trabalhadores. Eu digo isso porque todos nós sabemos que os empresários, os patrões dos comerciários são muito exigentes quando se trata de obrigar os seus funcionários a sempre andarem bem vestidos, bem arrumados, e esta boa arrumação, muitas vezes, não sai do bolso do empresário, mas sai do bolso, dos salários já minguados, do próprio trabalhador.

Também são exigentes na hora de exigir que o comerciário esteja sempre sorridente ao atender os clientes, porque esta é uma questão importante em matéria de vendas. Sorridente, até mesmo, quando, no fim do mês, recebe um salário que dá mais para chorar do que para sorrir. Mesmo assim, o patrão exige este desprendimento do trabalhador comerciário. Os salários baixos, o patrão sempre argumenta que não pode pagar mais, e, neste momento - e só neste momento -, costuma comparar o salário e as condições de trabalho dizendo que são compatíveis com um país subdesenvolvido, estão nos níveis salariais. Ou seja: na hora de pagar o salário, o empresário do setor não é nada moderno, ele prefere seguir as regras do Terceiro Mundo. Mas este patrão também é um patrão falante, fala em modernismos, fala que trabalhar aos sábados e domingos é moderno, como na Europa, mas quando alguém toca na necessidade de imitar, quem sabe, o modelo dos paises europeus, dos paises do Primeiro Mundo, nas condições de trabalho, nas condições dos salários, ou quem sabe no trato com o sindicato, no respeito ao sindicato da categoria, o patrão, invariavelmente, sempre atalha dizendo que modernismo tem limite, porque nesta hora modernismo tem limite, quando toca no bolso.

O patrão dos comerciários é um patrão bem falante, e chega a dizer que o seu interesse maior é servir à sociedade. Eu ouvi isso da boca dos representantes do SINDILOJAS em inúmeros debates que tivemos, onde diz que, para justificar, o comércio tem que estar aberto 24 horas por dia, que tem que ter total liberdade. Evidentemente, eles sempre colocam que com o cumprimento da legislação trabalhista, também, se não colocassem isso, seria o absurdo dos absurdos. Óbvio, mas para que o comércio funcione 24 horas por dia, porque o seu interesse, praticamente o mais importante dos seus interesses, é servir à sociedade, os empresários, nessa hora, eles sempre se colocam como uma espécie de filantropos, e a questão do lucro parece que é uma questão secundária, parece que o interesse principal é o interesse de servir à sociedade. Que bom se fosse verdade! Que bom se eu pudesse, hoje, vir a esta tribuna, Presidenta Esther, que eu pudesse vir a esta tribuna confessar que os empresários do comércio tinham razão, que era tudo culpa do Sábado-inglês: o desemprego, os baixos salários dos comerciários, a diminuição do consumo da população, que está aí a olhar para os shopping centers sem poder comprar. Que bom se um ano depois, praticamente, que esta Casa “desvotou” o Sábado-inglês, eu pudesse constatar, andando por aí, todas as lojas abertas aos sábados até a meia-noite, com moradores da periferia saindo sorridentes das lojas, abarrotados de compras, atendidos por comerciários felizes ganhando um bom salário, trabalhando em turnos alternados, com a legislação trabalhista cumprida à risca, a cada dia esses comerciários recebendo um novo colega de trabalho com aumento de emprego. Que bom se tudo isso que eles disseram quando da votação do Sábado-inglês, aqui, que o culpado de tudo que estava acontecendo era o Sábado-inglês. Que bom se hoje eu viesse aqui cabisbaixo confessar a vocês: olha, eu estava enganado, nós estávamos enganados, eles estavam certos, era tudo culpa do Sábado-inglês; olha só agora, que maravilha!

Que bom que toda aquela gente cadastrada pelo Dr. Renato Seguézio, do SINDILOJA, hoje nós estivéssemos encontrando atrás do balcão, trabalhando, porque ele cadastrou para dar emprego. Mas não é assim, os empresários estavam errados e, infelizmente, nós estávamos certos quando dizíamos que todo aquele tal de clamor popular, na verdade, foi inventado e que a culpa da situação, a culpa da redução das vendas, a culpa dos baixos salários dos trabalhadores do comércio não era por causa do Sábado-inglês. Que pena! O Sábado-inglês foi “desvotado” nesta Casa, e agora as lojas podem abrir até a meia-noite do sábado, se quiserem. Na semana seguinte da “desvotação” do Sábado-inglês nesta Casa, os mesmos rádios e TVs, os mesmos jornais que veiculavam uma semana antes aquelas manchetes “Desastre do Sábado-inglês”, “Clamor Popular”, registravam manchetes recessivas como aquelas várias manchetes que nós vimos dizendo que os lojistas estavam cada vez vendendo menos, que o comércio estava diminuindo suas vendas e, é óbvio, nós vivemos num País em crise.

Então, não era culpa do Sábado-inglês. E os mesmos empresários que nos chamavam de mentirosos, afirmavam o oposto daquilo que afirmavam uma semana antes. O próprio Dr. Alécio Ughini declarou que podia colocar a Xuxa dançando na frente das lojas que não iam aumentar as vendas, porque o problema da população era de falta de poder aquisitivo. Só que isso eu, o Barbosa e a Esther dissemos em vários debates, uma semana antes, quando íamos votar o Sábado-inglês, e nos chamavam de mentirosos. E depois, eles mesmos falavam o oposto. Hoje, a maioria das lojas estão fechadas, até parece que existe o Sábado-inglês. Os shopping centers, é verdade, funcionam. As pessoas que têm grana compram aos sábados à tarde, talvez até no domingo, se de repente esqueceram de avisar a empregada para fazer as compras durante a semana. O pessoal das vilas vai aos shopping centers, é verdade, mas passeiam por lá, a maioria com olhos arregalados de cobiça, sem poder comprar. Mas eu não vejo ninguém da periferia sair desses shoppings abarrotado de presentes e compras; sorrisos até encontramos, mas são sorrisos de amargura, de indignação ou de revolta. Não vejo nenhum comerciário sorrir feliz com o salário atrás do balcão, e também não vejo nenhum comerciário apertando a mão de um novo colega que chegou para trabalhar, porque o desemprego aí está. Acabou-se com o Sábado-inglês, e o desemprego continua. Na verdade, há uma crise generalizada, pouca gente para comprar porque há muito desemprego, pouco dinheiro, porque há uma crise generalizada na produção, e o comércio não pode fazer milagre.

O comércio é uma atividade econômica indiretamente produtiva. Investiu-se nos shopping centers, mesmo com as lojas fechadas e pouca gente para comprar. Os shoppings, agora, querem abrir, se possível, 24 horas por dia. A pergunta é: as vendas aumentarão? Mais gente vai poder comprar, apenas porque os shoppings investiram milhões e querem abrir 24 horas por dia? Os shoppings vão fazer o milagre da multiplicação dos pães, ou vão fazer a monopolização do setor? Mas eu não duvido que os bem falantes empresários do setor tentem inventar novamente um tal de clamor popular, buscando provar que são capazes de realizar a multiplicação dos pães. Afinal, o patrão dos comerciários é bem falante e está conseguindo convencer o povo de que amor de namorados, amor filial, amor maternal, amor de adulto, amor de criança, não é amor se não envolver a relação de compra e venda, de dar e receber presentes. Ao longo do tempo, estão tentando - e conseguindo - convencer até que o primeiro gesto do menino Jesus, na manjedoura, foi, quem sabe, pedir um presente. Tudo é motivo para a venda, assim eles raciocinam. Amar, rezar e vender são a mesma coisa, neste nosso mundo moderno. É isso que tenta passar, e daí trabalhar aos domingos ou não é tudo a mesma coisa, tudo que vale é a questão econômica. É por isso que os shopping centers, cada dia mais, vão se transformando - e eu digo infelizmente - num verdadeiro tempo de modernidade. É por isso que a luta dos comerciários, ao dizer não ao trabalho aos domingos, tem um significado muito mais profundo do que uma simples postura cooperativista, como aparentemente pode-se entender, ou querem que a gente entenda. Defender “não ao trabalho aos domingos” significa defender uma sociedade onde o consumo seja tão-somente em locais onde essa sociedade pode ser satisfeita, e não templos de veneração do bezerro de ouro. Defender o domingo para descanso, defender que não se trabalhe aos domingos significa defender uma sociedade mais fraterna e humana, onde o trabalho não seja um fim em si mesmo, mas um meio de realização individual e coletiva da sociedade humana.

Encerro, dizendo que defender o “não trabalho aos domingos” significa dizer sim à vida. Obrigado. (Palmas.)

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Registramos a presença dos Vereadores Nereu D’Ávila, Giovani Gregol e Ervino Besson. Registramos, também, que a Mesa da Câmara recebeu os cumprimentos pela homenagem do Dia do Comerciário, ao mesmo tempo que comunica a impossibilidade de comparecer da Profª Ester Pillar Grossi, Secretária Municipal da Educação; do Dr. José Carlos, Diretor-Presidente da EPATUR e do Sr. Secretário Municipal de Indústria e Comércio. Passamos às mãos da Presidenta do Sindicato dos Comerciários a correspondência recebida.

O Ver. Leão de Medeiros está com a palavra e falará em nome da Bancada do PDS.

 

O SR. LEÃO DE MEDEIROS: (Menciona os componentes da Mesa.) Minhas senhoras e meus senhores, em seu livro “A Luz da Estrela Morta”, Clarice Lispector cria a trágica personagem Macabéia, que é a imagem e semelhança de todos quantos, no dia-a-dia, somam os níqueis de seus salários e vivem, no seu trabalho, uma vida franciscana. Na crise da atualidade, na recessão, no desemprego, na angústia e na quimérica esperança de dias melhores, estamos todos envolvidos no mesmo papel, no mesmo drama. Os trabalhadores de salários aviltados tornaram-se, neste País, uma só família, com idênticos problemas, com as mesmas dificuldades. Somos, portanto, todos Macabéias, envolvidos num sofrimento diário, mas não perdendo, um minuto sequer, nossos sonhos de um futuro melhor. Senhores comerciários, acredito, fielmente, que é este sonho, esta ansiosa espera de dias melhores que os mantém unidos. E desta união nasce, sem dúvida, a força da elogiável classe dos comerciários.

Muitos deverão estar perguntando: por que este Vereador vem nos saudar, quando é defensor da proposta de abertura do comércio aos domingos nos shopping centers? E é fácil a explicação: primeiro, porque saudar a valorosa classe dos comerciários de Porto Alegre é sempre uma obrigação e uma tarefa gratificante, uma demonstração de respeito, e o faço com muita honra, em nome do PDS; segundo, porque, amando a liberdade, sendo um democrata convicto, não posso concordar com uma lei que proíba qualquer argumento de fazer aquilo que deseja, quando este desejo está alicerçado no trabalho, no desenvolvimento, no progresso. O direito que tem aquele que não quer trabalhar é igual ao do que deseja trabalhar, ambos são livres, e nisso reside a essência da liberdade, da democracia. Não se pode obrigar ninguém a trabalhar no dia preferencial de seu descanso, mas não se pode coibir os que desejam de fazê-lo. O direito destes deve ser tão sagrado quanto o daqueles. É este o meu respeitoso entendimento.

Se pretendo ver parte do comércio aberto aos domingos em Porto Alegre é devido a este princípio de liberdade, mas igualmente identificada como uma Cidade moderna e progressista. Mas o que se objetiva com a autorização da abertura parcial do comércio aos domingos não é a mesquinha exploração do comerciário, mas sim o respeito a todos quantos não quiserem trabalhar nesse dia, sejam quais forem os seus motivos, por convicção religiosa ou por justa preferência. Os judeus têm o seu dia sagrado, o shabat, o sábado; os muçulmanos dedicam a sexta-feira como o dia de suas orações e descanso; o cristão escolheu o domingo. Mas o que fazer quando muitos querem aumentar seus salários, quando muitos querem, na falta de outras atividades ou de oportunidades, aumentar seu ganho com um trabalho aos domingos? Privá-los, proibi-los? Isso não é liberdade, isso não é democracia. O direito desses deve ser respeitado e defendido.

Igualmente, senhores comerciários, não sou, na minha pretensão, defensor do chamado capitalismo selvagem, não sou partidário da exploração do homem pelo homem, em nenhuma hipótese e em nenhum momento. Acredito que trabalhar aos domingos é um direito e uma opção de quem quer, e também um direito de quem não quer trabalhar nesse dia. Mas, mesmo aqueles que desejarem trabalhar aos domingos devem ter seus direitos trabalhistas respeitados, suas conquistas sociais defendidas, e as recompensas amplamente asseguradas. Afinal, foram muitos anos de luta, de sacrifício, até, de vida, para se conquistarem esses direitos. Não sou estulto nem mau-caráter para não compreender isso. Defenderei, unido com os senhores, o direito dos que não querem trabalhar aos domingos, mas respeito, por firme e irremovível convicção política e democrática, o direito, também sagrado, dos que desejarem trabalhar no comércio aos domingos. Respeitosamente, reafirmo: é uma questão de liberdade. É a posição que respeitosamente possuo, e sei que há reciprocidade neste mútuo respeito. Nunca escondi minhas convicções.

Quero, hoje, nesta Sessão Solene, que é a homenagem desta Cidade de Porto Alegre, que tanto deve aos senhores, deixar bem clara e respeitosamente a minha posição inarredável dos princípios contrários, por mínima que seja, à intenção de alguém ferir o direito de alguns dos senhores. Quero, igualmente, congratular-me com o espírito de luta dos comerciários, com a coragem e altivez da sua Presidenta, Esther Machado, com quem me congratulo, e com isso, tenho certeza, estou prestando minhas homenagens a todos s comerciários porto-alegrenses.

Por derradeiro, volto a citar Clarice Lispector, a criadora da Macabéia. Ela, referindo-se aos trabalhadores que são explorados pelo capitalismo desalmado, diz que somos uma raça de anões. Os comerciários de Porto Alegre não pertencem a esta raça, estou certo. São gigantes na sua fraqueza, porque são unidos em torno dos mesmos ideais: o de tornar a família comerciária uma grande família, maior ainda do que atualmente o é, com salários que dêem a todos uma vida estável, que não mais necessitem se angustiar a cada trinta dias, que possam tranqüilamente desfrutar uma felicidade sonhada e desejada por todos. Que Deus dê a todos um dia feliz e um futuro de muita prosperidade é o meu sincero desejo. Muito obrigado.

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Informamos aos senhores presentes e aos Srs. Vereadores que usaria a palavra, neste momento, o Ver. Clóvis Brum, que falaria em nome da Bancada do PMDB e da Bancada do PFL. O Ver. Clóvis Brum não está presente porque está em Licença para Tratamento de Saúde na tarde de hoje, pelas informações que esta Mesa recebe. Nós queremos trazer, então, o nosso abraço, em nome da minha Bancada, o PMDB, e da Bancada do PFL, aos comerciários pela data de hoje.

Concedemos a palavra à Srª Esther Machado, Presidenta do Sindicato dos Comerciários de Porto Alegre.

 

A SRA. ESTHER MACHADO: (Menciona os componentes da Mesa.) Em primeiro lugar, quero agradecer a iniciativa do Ver. José Valdir em prestar esta homenagem aos comerciários pelo seu dia, que é amanhã, 30 de outubro, quer dizer que mais uma vez, infelizmente, os comerciários de Porto Alegre não têm muito o que comemorar no seu dia. Nos últimos anos tivemos algumas conquistas, entre elas o privilégio de ter sido uma das poucas categorias da área privada que conseguiu dissídios coletivos e que pelo menos se repôs a inflação. E que entre esses trabalhadores de categorias privadas nós somos uma das poucas, também - e posso até dizer que é a única -, que têm o maior piso de Porto Alegre, e é um salário, como já foi dito, aviltado, é um baixo salário, um salário que não satisfaz as mínimas necessidades de um trabalhador. Mas nós não temos, mais uma vez, nenhum motivo para comemorarmos o nosso dia, amanhã, porque o dia 1º de novembro é a nossa data-base, e não há negociação e proposta da classe patronal para o nosso dissídio.

Entre muitos fatores, existe sempre, infelizmente, o que é causado por esta Casa, que são os projetos que entram aqui para abrir o comércio nos domingos, são os projetos de horário livre. Projetos esses que são usados na mesa de negociação como forma de pressão. Ano passado, a Cidade inteira assistiu ao que foi a luta dos companheiros que são bravos, que são companheiros e companheiras que perderam seus empregos para poderem estar aqui num dia à tarde, porque, à tarde, o trabalhador não pode comparecer na sua Casa, a Casa do Povo, Câmara de Vereadores. Mas existe até uma certa previsão da nossa parte, porque todo final de ano é isso: quando não são esses trabalhadores, para humilhar os trabalhadores, é o Governo Federal com seus planos econômicos, roubando sempre do nosso bolso o nosso salário e a nossa tranqüilidade junto à nossa família. E há também agora o perigo da revisão da Constituição, de os trabalhadores virem a perder muitos direitos conquistados. Porque este Governo Collor, que está lá representando apenas uma facção da nossa sociedade, que é o poderio, que são os grandes empresários, está a serviço deles mesmos e está querendo acabar com a licença-maternidade, com a estabilidade do funcionário público, com a aposentadoria por tempo de serviço, com as férias, com o 13º salário. Enfim, com uma séria de conquistas que nós tivemos, que nossos avós conseguiram a custa de muito sangue e de morte.

Tivemos, no ano passado, nesta Casa, aprovado um Projeto que garantia o descanso no domingo, e que nós consideramos um retrocesso, nos dias de hoje, voltar a discutir novamente se trabalhamos no domingo, porque está mais do que claro, e ficou claro na época das discussões, que abrir o comércio nos domingos não abriria novos campos de trabalho. Pelo contrário, seriam usados os mesmos funcionários, que trabalhariam dentro das lojas, seriam usados no domingo e também durante a semana. Ficou bem claro, como disse o Ver. José Valdir, que nada mudou, que as lojas continuam funcionando nos sábados à tarde, ou algumas fecharam por acordo coletivo, e outras fecharam depois para provar que fazem aquilo que querem e não o que os trabalhadores desejam. E existe um fato muito pior ainda, que mais do que nunca os trabalhadores do comércio estão trabalhando no domingo, e que muitas e muitas lojas, muitas e muitas empresas que nunca abriram suas portas aos domingos, depois de aprovada a lei, começaram a abrir, e, o que é pior ainda, não existe um órgão nesta Cidade que fiscalize essas lojas, que multe essas lojas e que feche essas lojas. Nós estamos à mercê de toda a fiscalização, não só da área federal, porque lá existe uma clara intenção de acabar com o órgão de fiscalização do Ministério do Trabalho. Estamos à mercê, infelizmente, aqui nesta Cidade, por força da Prefeitura e da SMIC, que não fiscalizam a abertura do comércio aos domingos.

Então, Srs. Vereadores, a maior homenagem que poderá ser prestada aos comerciários é o respeito dos Senhores, que muito têm demonstrado pela nossa categoria, é o cumprimento das leis que, infelizmente, não cabe ao Sindicato fiscalizar, porque se nós pudéssemos entrar dentro de uma loja, autuar a loja, multar e fechar, temos certeza de que nenhuma lei trabalhista, nenhum direito conquistado, nenhuma lei seria infringida, mas o Sindicato não tem. E a maior homenagem que pode ser dada por esta Casa a nós, trabalhadores do comércio, é, em primeiro lugar, que não entrem com esse tipo de projeto de trabalhar aos domingos, de horário livre, de trabalhar sábado à tarde, porque isso nos ofende moralmente, porque não podemos trabalhar mais do que já trabalhamos, de segunda a sábado, de dez a doze horas por dia, e trabalhar mais no domingo, porque acima de tudo nós temos filhos, nós temos família, e se as pessoas, se a população desta Cidade, que nunca pediu o comércio aberto aos domingos, nunca sentiu como necessidade uma loja aberta aos domingos, se eles têm esse privilégio de sair com suas famílias aos domingos e entrar num shopping, ou sair pela Rua da Praia, nós também somos seres humanos e também temos que ter esse direito e esse privilégio.

Enquanto o Brasil for o que é, um País sem lei, onde as coisas acontecem sempre em benefício dos mais poderosos, em detrimento dos trabalhadores, esse tipo de lei nos ofende, nos humilha e nada traz de bem aos Srs. Vereadores que apresentam esse tipo de lei. A maior homenagem prestada a nós é pelo menos deixar o comerciário, no final de ano, vender, ganhar o seu salário sem se preocupar se vai ter que trabalhar no domingo ou não. É deixar o comerciário livre para lutar pelo seu salário, porque a nossa data-base coincide com o final de ano. (Palmas.) Porque fica muito difícil, como hoje de manhã, que tivemos uma primeira negociação sem nenhuma proposta. A classe nos apresentou um rol de 20 reivindicações, é até de rir, entre as quais abrir aos domingos, fazer balanço depois do horário, acabar com a estabilidade da gestante, de 90 dias, após o retorno da licença-maternidade, que nós temos no dissídio coletivo, reduzir o percentual de horas-extras dos comissionados e pedir que o Sindicato, encarecidamente, acabe com essa história de tolher o poder das empresas de abrir no horário que elas bem entendem. E jogam isso na nossa cara, e o comerciário sabendo que tem o dissídio coletivo, que tem o domingo, que tem o Sábado-inglês e que tem esta Casa para se preocupar. E quem sai ganhando com isso são os empresários, porque eles ficam sozinhos lutando contra nós, mas sozinhos com toda a força e todo o poder deles.

A maior homenagem que os Srs. Vereadores podem nos dar é que, pelo menos no final de ano, não nos apresentem esses projetos. Deixem o comerciário lutar pelo seu salário e conquistar mais ainda, porque nós precisamos. E a maior homenagem, também, que a Secretaria de Indústria e Comércio e a Prefeitura passem a fiscalizar as empresas que estão abrindo hoje, como a CEASA. Porque apenas um dia de batida nesta Cidade, uma autuação da SMIC mostrando uma multa para quem abrir no domingo, nunca mais teremos uma lei a ser infringida nesta Cidade. Eu tenho certeza de que nunca mais o Sindicato terá que entrar num shopping center, como nós entramos neste domingo, e de 167 lojas havia 30 lojas com todo o corpo de funcionários trabalhando domingo, mas não nesse domingo que antecede à abertura do shopping. Estão lá há três domingos trabalhando dentro das lojas. São vendedores contratados limpando vitrines com benzina, vendedores contratados colando carpetes, como nós vimos na Gaston, como vimos na Courolândia. E lá não tinha ninguém para multar ou autuar essas empresas. E nós havíamos combinado com os órgãos competentes, e eles não compareceram, e o Sindicato estava lá. Então, a maior homenagem é que esta Casa, que nos contemplou com o domingo, que nos garantiu esse descanso, que os Srs. Vereadores que respeitam os comerciários nos dêem esse fórum, e, acima de tudo, continuem abrindo seus braços para os comerciários, porque assim como os comerciários precisam da Câmara de Vereadores, a Câmara de Vereadores precisa dos comerciários, porque somos trabalhadores e a maior categoria desta Cidade. Portanto, sabemos do nosso peso, mas queremos usá-lo para garantir as nossas conquistas. E peço desculpas pela dureza das minhas palavras, num dia em que estamos sendo homenageados, mas o que está acontecendo é preciso ser dito.

Agora, peço mais uma vez, não usem a nossa categoria do jeito que estão usando, porque já estamos cansados, já fomos usados demais, porque a cada final de ano e véspera de eleição, chovem candidatos dentro das lojas, oferecendo tudo, aí viram as costas e nos tiram tudo, e nós elegemos muitos dos senhores aqui, e nós temos a consciência de que nós deixamos de eleger muitos dos que votaram contra o Sábado-inglês, mas não queremos usar isso. Nós queremos usar a nossa força para encontrarmos as soluções para a nossa Cidade que está abandonada, para o comerciário que está morrendo dentro das lojas, porque não temos segurança, queremos encontrar solução para que os companheiros menores de idade, dentro de supermercado, não sejam mais mutilados do jeito que foram este ano, quando um companheiro do Dosul, em Capão da Canoa - não é nossa base, mas ele mora aqui -, está em estado de coma, porque caiu uma caixa de tomates na cabeça, e ele vive vegetativamente há dois anos; o companheiro que ficou paralítico, do Supermercado Econômico, porque caiu de cima do telhado, enquanto limpava uma calha, menor de idade e empacotador; o companheiro do Dosul que teve o braço decepado por uma máquina de moer carne; não queremos outro companheiro como o que, dentro do Supermercado Zaffari, perdeu todo o braço direito com a máquina de moer carne. Essas coisas acontecem no comércio, mas não chegam aqui, porque a imprensa boicota, porque as empresas querem esconder o trabalho que o Sindicato está fazendo. Agora, sabemos que as questões de condições de trabalho, de insalubridade, compete ao Sindicato e ao Ministério do Trabalho, mas sabemos, também, que as firmas são manipuladas. E há uma lei que proíbe isso. As empresas elegem os cargos de confiança, acontece muita coisa dentro do comércio, e ninguém sabe. É preciso que os Srs. Vereadores usem da sua influência, chamem o Sindicato e nos ajudem a encontrar uma solução para esses problemas todos, de nos explorarem a favor dessas pessoas que ainda têm influência nesta Cidade. Isso não tem sentido, a história se repete em todos os finais de ano.

Agradeço ao Ver. José Valdir, ao Presidente em exercício da Casa, aos Srs. Vereadores. O comerciário é um ser humano que, acima de tudo, merece respeito e dignidade. Muito obrigada.

(Não revisto pela oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE: Ver. Adroaldo Corrêa.

 

O SR. ADROALDO CORRÊA (Requerimento): Sr. Presidente, eu gostaria de encaminhar um pedido à Mesa para obter cópia do discurso da companheira Esther Machado e, se possível, solicitar que a Mesa encaminhasse cópias também aos demais Vereadores desta Casa.

 

O SR. PRESIDENTE: A Mesa providenciará a distribuição de cópias a todos os Srs. Vereadores.

Senhoras e senhores comerciários, nossos visitantes, ao encerrarmos esta Sessão, cumprimentamos, em nome da Mesa Diretora da Câmara Municipal e em nome dos Srs. Vereadores, e a todos agradecemos pelas presenças. Muito boa tarde.

 

(Levanta-se a Sessão às 18h.)

 

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